terça-feira, 12 de maio de 2015

TRABALHISTA, GRAÇAS A DEUS! (OU: "É O TRABALHO, ESTÚPIDO!")

Nesses períodos de crise política, ao mesmo tempo em que pululam as "análises de conjuntura", sobram vaticínios, quase sempre sombrios, acerca "do que vem por aí". Estivessem sempre certas estas Cassandras e a Humanidade já teria desaparecido numa hecatombe atômica.
Na cena política, enquanto o governo federal permanece acuado pelas consequências de suas próprias falhas, bandidos da pior espécie se aproveitam da situação e tentam demolir décadas de avanços sociais, atacando a CLT, leis ambientais, políticas de Direitos Humanos, a Petrobras e várias outras conquistas institucionais - o que mostra que aquilo que é conquistado deve ser sempre defendido sob pena de ser tomado.
Como é do meu feitio, vou acusar vilões. Como trabalhista histórico que sou, dane-se se isso for um conceito antiquado, eu defendo o trabalho e os seus principais atores - os trabalhadores, é claro.


A Direita adora criticar políticas sociais como assistencialistas. De fato, há aqueles que sempre buscarão se encostar em algum benefício. Conversei uma vez com um flanelinha em Campos que vivia basicamente dos trocados que conseguia nos estacionamentos e do "um real" - almoço por um real, sopa de um real, remédio de um real... Mas o que é esse cara perto da turma que vive de renda? Do cara que, no início do ano, tem R$ 1 milhão no banco e, ao final deste, sem suar uma gota, ganhou mais R$ 100 mil? Pior que este, do cara que tem poder suficiente para manipular o cassino do mercado de ações e ganhar mais que isso num dia? O fato de haver quem finja estar doente pra pegar um "bombril" não significa que se deva acabar com o abono médico!
Alguém dirá que aqueles "investimentos" podem ser tributados e algo ser então revertido em prol do bem comum. Na prática isso não ocorre, porque a maior parte dessa renda vem de títulos públicos, ou seja, é dinheiro tirado do trabalho e do investimento produtivo para o rentismo puro e simples que nada produz. Ainda que uma alíquota disso retorne para o Erário, será apenas uma fração do que foi perdido.
Vivemos num sistema que nos rouba o pão e nos oferece algumas migalhas.
Mas não é só isso. Esse sistema criou outros monstros que ganham dinheiro sem nada produzir. Nos últimos meses eu e minha mulher nos deparamos com necessidades de obter certidões, alvarás e outros documentos emitidos pelo poder público ou por esses estabelecimentos onipresentes chamados (argh!) "cartórios". Vou falar destes últimos. Podemos chamá-los também de "fábricas de dinheiro". É um tal de "enésimo ofício disso", "zerésimo ofício daquilo"... E tome taxa pra tirar um monte de certidões, autenticar documentos, reconhecer firmas... Será que algum cartório já pagou indenização a alguém por ter "reconhecido" uma assinatura falsificada? É, acho que não. Mas ai de você se não tiver a maldita "firma reconhecida"! E não se consegue isso num único lugar! Para um único processo, eu e ela tivemos que ir a QUATRO cartórios! É, essa cambada é solidária! Nada de "competição", não, é cartel mesmo, não é a toa que "cartorial" é um termo pejorativo.
Claro que tem gente trabalhando nesses lugares, mas a "produção", que é o que deveria gerar riqueza, é no mínimo virtual, simbólica, ritualística. Pagamos por um símbolo. Numa inversão absurda, o "ônus da prova" fica com o "acusado". O Estado, que te nega o benefício da dúvida, que pressupõe que você é um vigarista, ainda te faz pagar pra provar sua inocência!
Outra praga que se dissemina (agora que vou mexer num vespeiro pior ainda) é o "capitalismo da fé". Estive em reunião com um cidadão interessado em comprar um apartamento de uma parente. Profissão? Pastor. E também cantor ("evangélico", lógico). Ah, e também vendedor de carros (ao menos isso parecia trabalho!). Mas ele se apresentou como, essencialmente, pastor. Vive disso, sustenta a família com isso. Isso o quê? Ora, ele mesmo (embora eu não perguntasse) veio dizendo que "teve uma visão" na igreja que frequentava e que disse ao pastor da mesma que iria abrir uma nova - já estava na terceira (ou quarta, ou décima, sei lá). Então, a coisa funciona assim: como não dá pra ter uma igreja só de pastores, afinal quem banca a parada são as ovelhas, para "subir na hierarquia" o cara tem que "abrir uma filial" (é, vale até franchising), "expandindo o negócio". Produzindo o quê? Nem bíblias. Não, nada tenho contra religiões em geral (tenho contra algumas). Nutro um baita respeito pelo protestantismo e muitos dos meus amigos são adeptos desse ramo do cristianismo. Mas não sou amigo de quem seja sustentado pela fé alheia. Quer ter religião, trabalhe honestamente - produzindo - e dedique-se à instituição de sua escolha nas horas vagas. Religião (qualquer uma) não é pra ganhar dinheiro, penso assim e nesse ponto sou radical.

Ah, o tal pastor acabou (deve ter sido uma intervenção divina!) desistindo do negócio. Afinal, tinha que comprovar renda, essas coisas, e aí complica pra quem recebe dinheiro num envelope. Quem comprou o apartamento foi um arquiteto. Ufa!
É, eu penso que riqueza gerada sem trabalho é um mal. De um jeito ou de outro, quem trabalha paga a conta. Isso é diferente de ajudar quem precisa. Sempre haverá pessoas incapacitadas, temporária ou permanentemente, para o trabalho, logo precisarão ser sustentadas por outras, seja diretamente (família, amigos, etc.), seja por um sistema de seguridade social. Não é vergonhoso precisar de e receber ajuda. Vergonha é não merecê-la. E esses chupa-sangues profissionais merecem é...

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