Algumas pessoas, supostamente com boas intenções, criticam programas
como o bolsa-família alegando que ele "escraviza" as pessoas tornando-as
reféns do governo. Isso decorre de uma visão distorcida do que
caracteriza uma renda básica de cidadania e também de um preconceito das
classes média e rica, onde muitos veem nesses benefícios uma vantagem indevida,
mas não pensam em abrir mão de inversões às quais têm direito no sistema
atual. Vejamos, por exemplo, as deduções ao Imposto de Renda: são
permitidas deduções para despesas médicas. Nesse momento o
Estado assume que não cumpre totalmente com suas obrigações e renuncia a
uma parte da arrecadação em compensação pelos gastos que as classes
média e alta têm com saúde. Podem alegar que a carga tributária sobre os
rendimentos das pessoas físicas em si já é muito alta. Pode ser. Mas,
em países onde a saúde e outros serviços públicos são excelentes, essa
carga é ainda maior. A CPMF, um tributo "merreca" e que servia para
taxar muita transação que corre "por fora", inclusive de maneira ilegal,
havia sido criada para financiar a Saúde. Foi, primeiramente,
desvirtuada e depois extinta. Voltando à dedução dos gastos com saúde,
esta é uma medida que beneficia exclusivamente as classes média e alta,
que podem pagar um plano privado. O argumento dos que são contrários ao
bolsa-família na linha do "certo é a pessoa ter condições de se
manter", deve ser confrontado com o "certo é termos um serviço de saúde
adequado". É a mesma coisa! Mas, enquanto não o temos, o que se faz?
Buscamos o apoio do setor privado e o financiamos indiretamente via
renúncia fiscal. É o ideal? Não acho, mas é assim que fazemos hoje, e
isso já existia ANTES do bolsa-família. Saúde é UMA das deduções.
Existem as deduções por dependentes, educação, previdência privada e até para aplicações no
mercado de ações! Como é mais fácil pobre comer caviar do que ter um investimento desses, ninguém diz que é "bolsa-burguesia", mas é! Alguns vão
dizer: "Mas é o MEU dinheiro!". Sim, como também é "meu, seu, nosso",
todo o dinheiro público. Quem paga a pavimentação da sua rua, o salário
do policial, a coleta de lixo? Você, eu, todos nós. Tributaristas
tarimbados já provaram que, no sistema vigente, pobre paga
proporcionalmente mais imposto que rico, porque a incidência sobre o
consumo pesa mais para quem ganha menos. Eu tenho UM amigo que é
honestamente pelo Estado Mínimo, contra qualquer medida que lembre o
"Estado de Bem-Estar Social". Ele é coerente. A maioria que berra contra
o bolsa-família fica muito feliz com suas deduções e quer ainda mais,
como os membros do Judiciário que recebem "auxílio-moradia" e
"auxílio-educação" ISENTOS de IR. Tenho um outro amigo cuja esposa nunca
trabalhou. Pois bem, com isso ele recebe um "bolsa-madame" de pouco
mais de R$ 170,00 por mês. Pouco? É muito pouco, mas é praticamente
igual ao benefício médio do bolsa-família, que é de aproximadamente R$
167,00 mensais. Só que estes R$ 167,00 fazem uma puta diferença na renda
de uma família pobre, enquanto nós da classe média gastamos isso num
jantar. Finalizando, se o pobre tem um cartão de bolsa-família, ele
ganha dignidade, porque não precisa mais ir "pedir favor pro coroné".
Não se submete mais à escravidão e à humilhação. Isso é revolucionário
num país tão desigual como o nosso.
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