quarta-feira, 8 de outubro de 2014

BOLSA-FAMÍLIA E OUTRAS BOLSAS

Algumas pessoas, supostamente com boas intenções, criticam programas como o bolsa-família alegando que ele "escraviza" as pessoas tornando-as reféns do governo. Isso decorre de uma visão distorcida do que caracteriza uma renda básica de cidadania e também de um preconceito das classes média e rica, onde muitos veem nesses benefícios uma vantagem indevida, mas não pensam em abrir mão de inversões às quais têm direito no sistema atual. Vejamos, por exemplo, as deduções ao Imposto de Renda: são permitidas deduções para despesas médicas. Nesse momento o Estado assume que não cumpre totalmente com suas obrigações e renuncia a uma parte da arrecadação em compensação pelos gastos que as classes média e alta têm com saúde. Podem alegar que a carga tributária sobre os rendimentos das pessoas físicas em si já é muito alta. Pode ser. Mas, em países onde a saúde e outros serviços públicos são excelentes, essa carga é ainda maior. A CPMF, um tributo "merreca" e que servia para taxar muita transação que corre "por fora", inclusive de maneira ilegal, havia sido criada para financiar a Saúde. Foi, primeiramente, desvirtuada e depois extinta. Voltando à dedução dos gastos com saúde, esta é uma medida que beneficia exclusivamente as classes média e alta, que podem pagar um plano privado. O argumento dos que são contrários ao bolsa-família na linha do "certo é a pessoa ter condições de se manter", deve ser confrontado com o "certo é termos um serviço de saúde adequado". É a mesma coisa! Mas, enquanto não o temos, o que se faz? Buscamos o apoio do setor privado e o financiamos indiretamente via renúncia fiscal. É o ideal? Não acho, mas é assim que fazemos hoje, e isso já existia ANTES do bolsa-família. Saúde é UMA das deduções. Existem as deduções por dependentes, educação, previdência privada e até para aplicações no mercado de ações! Como é mais fácil pobre comer caviar do que ter um investimento desses, ninguém diz que é "bolsa-burguesia", mas é! Alguns vão dizer: "Mas é o MEU dinheiro!". Sim, como também é "meu, seu, nosso", todo o dinheiro público. Quem paga a pavimentação da sua rua, o salário do policial, a coleta de lixo? Você, eu, todos nós. Tributaristas tarimbados já provaram que, no sistema vigente, pobre paga proporcionalmente mais imposto que rico, porque a incidência sobre o consumo pesa mais para quem ganha menos. Eu tenho UM amigo que é honestamente pelo Estado Mínimo, contra qualquer medida que lembre o "Estado de Bem-Estar Social". Ele é coerente. A maioria que berra contra o bolsa-família fica muito feliz com suas deduções e quer ainda mais, como os membros do Judiciário que recebem "auxílio-moradia" e "auxílio-educação" ISENTOS de IR. Tenho um outro amigo cuja esposa nunca trabalhou. Pois bem, com isso ele recebe um "bolsa-madame" de pouco mais de R$ 170,00 por mês. Pouco? É muito pouco, mas é praticamente igual ao benefício médio do bolsa-família, que é de aproximadamente R$ 167,00 mensais. Só que estes R$ 167,00 fazem uma puta diferença na renda de uma família pobre, enquanto nós da classe média gastamos isso num jantar. Finalizando, se o pobre tem um cartão de bolsa-família, ele ganha dignidade, porque não precisa mais ir "pedir favor pro coroné". Não se submete mais à escravidão e à humilhação. Isso é revolucionário num país tão desigual como o nosso.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

RECONSTRUIR - II

A (verdadeira) catástrofe de BH.
"Acidentes como esse, infelizmente, acontecem." Não, essa frase não é do Felipão nem do Parreira. É do Prefeito Márcio Lacerda, na coletiva que deu após o desabamento de um viaduto em construção na mesma Belo Horizonte onde, cinco dias depois, a Seleção sucumbiria. Aviso que a frase foi propositadamente pinçada do seu contexto: na mesma entrevista o alcaide admitiu que certamente houve erros mas que as investigações é que os apontariam.
Pensava iniciar o segundo texto desta série sem usar o mesmo recurso do primeiro. Aí vem o Coordenador Técnico da Seleção, o outrora vitorioso Carlos Alberto Parreira, e diz o seguinte: "Não houve um deslize, um erro, no operacional nem na logística. Tudo foi perfeito. Só não funcionou o resultado do jogo contra a Alemanha”. Outra pérola: "Ontem foi uma coisa atípica. Um tsunami. Não tem explicação. É explicar o inexplicável."
Não é bem assim.
O ser humano tem limitações e nem sempre as catástrofes são evitáveis. É simples analisar os eventos depois dos mesmos consumados, mas os raciocínios a posteriori dificilmente seriam possíveis a priori. Mas existem as lições aprendidas, a experiência, o planejamento, a avaliação de riscos, a humildade e muitos outros recursos a nos alertar sobre os perigos e ajudar a prevenir falhas, seja numa construção, num torneio esportivo ou em qualquer outra atividade. Quando as mesmas acontecem, o acaso raramente tem relevância.
No caso da Copa, é óbvio que a Seleção não vinha jogando bem. Embora México, Chile e Colômbia não fossem equipes fracas ou medíocres, nem contra Camarões nós convencemos. Os diversos erros táticos eram apontados por parte da crônica esportiva, às vezes acusada de pessimista demais. Para piorar, revelou-se que os observadores Alexandre Gallo e Roque Júnior tiveram as recomendações de seu relatório sobre a Alemanha completamente ignoradas. Situação que os Inspetores de Equipamentos e outros técnicos ligados à área de Segurança Industrial conhecem bem e que pode ter acontecido nessa obra do viaduto. Alguém avisa, ninguém escuta, e aí...
Portanto, os senhores Parreira, Felipão e agregados, além de assumir a responsabilidade pelo fracasso, o que de fato fizeram, teriam que de antemão dizer algo como: "Não fizemos um bom trabalho. Passamos por um triz pelas oitavas. Não jogamos bem e, quando enfrentamos um adversário superior, fomos massacrados." Tratar a "pane" de seis minutos isolada do contexto é uma covardia com os jogadores e, acima de tudo, um completo equívoco. Quando o avião da TAM patinou na pista de Congonhas, matando 199 pessoas, a tentativa imediata foi atribuir tudo a um erro do piloto. Porém, depois ficamos sabendo do problema do reverso travado, da falta de ranhuras na pista, das condições meteorológicas que indicavam a necessidade de fechamento da mesma, etc. A Comissão Técnica da Seleção quis fazer o mesmo que tentaram algumas autoridades e a companhia aérea. Culpar o piloto.
A série continua, para desespero dos meus 26 seguidores.

quarta-feira, 9 de julho de 2014

RECONSTRUIR - I

Um desastre que foi um "ponto de mutação" na indústria química.
A imagem acima retrata como ficou uma unidade de indústria química em 1974, no Reino Unido. Informações sobre esse terrível acidente podem ser encontradas aqui, no excelente blog do Cesar Cunha.
E por que cito esse evento um dia depois do "desastre" do Mineirão? Exatamente por isso, ora bolas! A tragédia de Flixborough produziu inúmeras lições aprendidas por toda a indústria química mundial a respeito de mudanças e intervenções mal conduzidas. Foi um verdadeiro "ponto de mutação" de uma tradição baseada no improviso e no saber individualizado para outra de projetos bem documentados e registrados.

Os dois melhores desse time.
Sobre esse acachapante 7x1, um resultado que superou as piores expectativas - o ótimo Roberto Sander cravara "apenas" 4x0 - podemos dizer que começou a ser configurado naquela nossa memorável vitória sobre a então "poderosa" (hoje a sabemos decadente) Espanha, os 3x0 da final da Copa das Confederações. Neymar fez um, Fred dois, David Luiz salvou um gol, Júlio César outro, eles perderam um pênalti... Agora ficou claro que o Felipão foi beneficiado - e depois iludido, como muitos de nós - pelo efeito motivador que um novo treinador usualmente provoca. Mano Menezes, com aquele seu carisma de chuchu de hospital, parecia perceber melhor as limitações da geração de que dispunha. O grande erro que o antecessor de Felipão cometera, provavelmente por pressão da CBF, foi indicado neste blog, como pode ser lido aqui. Sem eliminatórias, o foco deveria ter sido a Olimpíada de Londres (2012) e, a partir dali, com a base formada, partir para 2014.
Como a história só se repete como farsa, acreditou-se na possibilidade de refazer a magia de 2001-2002 doze anos depois. Mas se, naquela época, Felipão despontava coroado de títulos, num período mais recente seu retrospecto era no mínimo preocupante. Levou o Palmeiras ao título da Copa do Brasil de 2012 E ao rebaixamento no Brasileirão do mesmo ano, ainda que tenha sido substituído antes do final deste. Parreira, nos seus últimos trabalhos como treinador, acumulou fracassos.
Mas não podemos massacrar esses caras. Fizeram um trabalho ruim, é verdade, pois não foi só o "apagão" de seis minutos. Esta Seleção não jogou bem nenhuma partida completa. Suas principais jogadas eram os lançamentos de David Luiz, as arrancadas de Neymar e os escanteios. Não tínhamos armação de jogadas pelo meio nem jogadas de linha de fundo. Outros fariam melhor? No Brasil o cenário é sombrio. Nossos treinadores, em geral, são caras defasados e arrogantes. A Argentina tem meia dúzia de técnicos que "jantam" quaisquer dos nossos "professores".
Que a Reconstrução comece já no próximo sábado, quando o Brasil encerra sua participação nesta Copa. No próximo texto escreverei sobre o que acho que deve ser feito depois desse jogo.

sábado, 7 de junho de 2014

DEIXEM O POVO CANTAR!

Uma das coisas mais idiotas que ultimamente se tenta macaquear(*) dos EUA é a ideia de colocar cantores, profissionais ou não, para cantar o hino nacional. Péssima ideia. O hino é bonito e emocionante cantado pelo povo, e somente assim. Presenciei uma situação constrangedora num jogo Brasil x Bolívia, onde a cantora escalada "interpretou" o hino horrivelmente, atrapalhando o povo nas arquibancadas que tentava em vão fugir da "interpretação" da infeliz. Não vaiamos por respeito ao hino, mas que deu vontade, deu. Nesta Copa, PELAMORDEDEUS, não coloquem cantores para tomar o lugar do povo. DEIXEM O POVO CANTAR!
http://youtu.be/xQ7WMPTauNk

(*) Macaquear = imitar de maneira ridícula e subserviente.

sábado, 5 de abril de 2014

José Wilker, Presente!

Sempre brilhante.

Em um Brasil repleto de subcelebridades artificiais, tão vazias quanto notórias e descartáveis, José Wilker foi discreto até na maneira como nos deixou. Inteligente, lúcido, dono de uma voz impostada como poucas, era desses atores capazes de interpretar qualquer personagem, sempre de maneira absolutamente marcante. Subutilizado nos primeiros anos de TV, seguiu trabalhando e nos brindou com magníficas atuações no cinema. Conquistou então o espaço que merecia também na telinha. A entrevista que deu à excelente Bianca Ramoneda em 2012 mostra um cara consciente e perplexo diante de um Brasil que ele ainda tentava compreender. Vale cada segundo, como vale assistir cada segundo de suas interpretações.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

QUESTÃO DE TEMPO ("About Time")

Com relação a um tema que abordei no meu recente texto "Finitude", segue uma indicação de um filme que me emocionou bastante (quem ler a outra crônica e assistir o filme vai entender por quê). Sem contar que tem no elenco a adorável Rachel McAdams. Não posso dizer mais nada, só recomendar que assistam, ainda está em cartaz no Rio.

Adoro essa atriz.